quinta-feira, março 18, 2004

Triste Fim de Um Brasileiro

Quem nunca ouviu falar à respeito do memorável personagem Policarpo Quaresma retratado pelo célebre Lima Barreto em sua obra mais conhecida "Triste Fim de Policarpo Quaresma"? Policarpo é um servidor público cujo amor maior é a pátria. Vive pela pátria e tudo oque faz é em função da mesma. Lê livros sobre sociologia brasileira, agricultura brasileira, geologia brasileira, geografia brasileira, economia brasileira, efim, tudo em sua vida tem um toque verde-amarelo. Quando abre a boca para dialogar, embora isso seja um pouco raro devido ao seu caráter reservado, Quaresma sempre ufana algum aspecto de nossa terra. Ao desenrolar da trama, ao contrário do que se pensa em primeira análise, Quaresma que vive a acariciar gentilmente os longos cabelos da pátria mãe (gentíl?),desta, só recebe dolorosos murros de desilusão.
Policarpo Quaresma é na verdade uma representação do povo brasileiro. O mais fantástico desse livro é que ele ainda permite essa análise mesmo tendo sido escrito no começo do século 20. Assim como o major Quaresma, o povo brasileiro vive em sua colorida ilusão canarinha, imaginando estar com os pés sobre uma terra abençoada por Deus, gigante pela sua própria natureza onde as palmeiras tem mais sabiás do que lá. O problema, é o fato dessa relação amorosa não ser recíproca. O quê o brasileiro recebe em troca de sua dedicação para com o seu país? Impostos que lhe tomam metade do salário, políticos de vida opulenta que usufruem do dinheiro público para dar suas festinhas regadas a coquetéis de talco para o nariz, sistemas de educação em estado de calamidade, hospitais decrépitos que deixam os pacientes morrerem na fila de atendimento, aumento da idade mínima de aposentadoria para obrigar-lhe a mais alguns anos de escravidão, e, caso você tenha exercido alguma profissão no ramo da servidoria pública, ao receber a sua carta de alforria, terá que financiar mais algumas festinhas e obras que virão a ser superfaturadas com o dinheiro que deveria ser aplicado na compra de medicamentos que sustentariam os seus anos de liberdade restantes.
Um exemplo vivo: minha mãe. Depois de muito ralar as nádegas na cadeira e passar horas a fio metida em páginas e páginas de apostilas de cursinho com seu conteúdo super intrigante, Anna Valéria consegue ser aprovada no disputado curso de ciências médicas da Universidade Estadual de Campinas. Seguindo seu idealismo e pretendendo atuar em uma área em que pudesse ser útil à sociedade em geral, ela escolhe a residência de Saúde Pública. Resultado: total desconsideração pelo seu trabalho, cujo salário mal pagava os abusivos impostos já mencionados. Enfim, ela mudou de residência.
Outro exemplo que presencie no jornal: um professor de química da rede púlica foi premiado com o prêmio do Estado de R$6000,00 por sua destacada atuação. "Uau, que bolada!", pode pensar você. É, realmente, quando confrontado com os míseros R$1200,00 que ele recebe por mês para dar 32 horas de aula por semana, esse bônus é um luxo.
Veja só, voltamos à velha questão sobre educação e saúde, duas áreas de fundamental importância em qualquer nação do planeta. Os personagens que seguem esses roteiros são verdadeiros heróis (é claro que sempre existem alguns picaretas, mas isso é inevitável) pois exercem suas profissões por prazer e paixão, por acreditar que estão atuando em prol do conjunto como um todo, pois, se dependerem dos caprichos da pátria mãe (gentíl?) serão tratados como farrapos. Enquanto isso, direto do planalto central, posso até ouvir o rufar das modinhas de carnaval. As festinhas regadas a talco para o nariz vão de vento em popa.

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