quarta-feira, dezembro 01, 2004

Eu sou fiscal do Sarney

Quem não se lembra do famoso contra-golpe governamental que tinha por objetivo acertar em cheio o coração da inflação? Estou falando do incidente que marcou o governo Sarney, na década de 1980 e lançou para a posteridade a modinha: "Eu sou fiscal do Sarney". Provavelmente, muitos não saibam o que diabos foi isso, o que até é compreensível, posto que a maioria dos leitores desse "corpete digital" não eram nem mesmo dublês de zigoto na época (eu mesmo não era), mas posso assegurar que não perdemos muita coisa, exceto a possibilidade de dar algumas risadas.
É fato que durante um parco período de tempo essa estratégia até chegou a dar certo, mas logo ruiu por terra revelando a débil estrutura das políticas econômicas brasileiras. O plano consistia na distribuição massiva de brochinhos com a máxima: "Eu sou fiscal do Sarney" e a intenção era que a população realmente entrasse na brincadeira e assumisse o papel de fiscais da economia em prol do bem geral da comunidade nacional (ufanismo barato e patriotismo clichê). Acredito que essa prática tenha dado certo durante um tempo, não pelo espírito combativo de velinhas que iam ao front dos supermercados averiguar o preço abusivo do rabanete, que havia subido 2 centavos na última semana, mas por toda a logística que ele requisitou.
Imagine só você, caro Piloro, como a indústria do plástico e de tintas deve ter se aquecido na época para produzir os tais brochinhos banhados em verde-amarelo canarinho. Imaginem também como não ficaram contentes os carnavalescos de plantão diante da possibilidade de criação de inúmeras fantasias e canções construtivas que infestam as rádios FM ("Focamos Merda") durante períodos relâmpago de duas semanas.
A bem da verdade, embora não me caiba o papel de desvendar verdade alguma (se é que ela existe), o Brasil é de fato o país do carnaval. Nada é levado a sério nessa terra de chuva de confetes eternos. Se alguma figura superfatura a obra de um hospital para crianças com câncer ela logo vira celebridade e é convidada para participar do "Big Brother 23", ou qualquer outro programa plagiado da rede holandesa de televisão; Se um político é flagrado em escândalos de corrupção generalizada, abre-se uma CPI de nome esdrúxulo (CPI dos anões, CPI dos papagaios Dançantes, CPI dos Canos de PVC Periculosos...), a sujeira é jogada debaixo do tapete e o dengo é presenteado com férias ilimitadas e sortidas em algum canto da Europa, antes, é claro, de inspirar uma nova personagem na novela, esse programa de qualidade apurada que tanto contribui para a riqueza da cultura nacional; Se algum banco mostra sinais de falência por má administração, leia-se corrupta e imprudente, o governo logo vem com seus dólares de glicose para salvaguardá-lo.
Se Aldir Blanc e João Bosco disseram uma vez que "a alegria de quem está apaixonado é como a euforia de um gol anulado" eu digo que "alegria do brasileiro é um carnaval prolongado".

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