Não-alinhado

São Paulo é uma grande fossa por onde se arrasta a merda eterna do ser humano. Uma miscelânea de concreto e vidas fragmentadas que ilustram o mais belo exemplo da miséria humana. Como que escarrados, cuspidos de uma cloaca úmida e hostil, os passantes andam às pressas nas ruas repressoras reinadas por automóveis pestilentos e seus condutores ainda mais odiosos. Nunca ouse entrar no reino em sinal fechado. Você será atropelado e seu corpo pisoteado. Tento fechar os olhos e imaginar que isso tudo não passa de um pesadelo. Mas o barulho que não cessa interrompe o sono, e a cidade se apressa em me jogar ao bando comum de pobres diabos, junto às ovelhas assustadas que se aglutinam no cercamento contíguo, prestes a virar patê de gente. Gente em cuja alma já não mais. Se é que um dia houve. Gente cuja alma fora vendida a preço de labuta sofrida no pérfido leilão do patrão. São Paulo é como uma feijoada escrota que reúne as piores partes do porco. E são porcos também, aqueles que vagam pelas ruas lamacentas, ruminando o vômito interno de angústia reprimida. O sangue vira água e escorre pelos ralos lodosos. Só se fala em dinheiro, e em como ganhar dinheiro e como o fulano escroto, barrigudo e careca de filhos ausentes e esposa infeliz comeu a puta mais gostosa do recinto no último fim de semana. De como fulano de sobrenome tal (família “nobre”) acionou seu contato no Congresso e faturou com a venda de rins clandestinos. Só se fala em como o governo deu mais uma cartada e sacaneou meio mundo de gente desviando dinheiro do contribuinte. E o sistema segue, movido aangústia, suor alheio e calhordas parasitas, que, de cima, mamam os debaixo sugando-os até o último suspiro. Quem dera. Não admira. Num mundo governado por porcos, os governantes reinam para a sua gente. O sexo seca. Mundinho besta. Árido. Impessoal. E o cicrano, cuja única diversão é chegar cansado do trabalho e bater uma punheta pra vizinha do bloco 31-A em frente que sempre mostra as graças exatamente às 21: 32h (segundo bloco da novela, esquentar o arroz e fritar um ovo). Nunca pensou em falar com ela. A punheta basta. Nem sequer sabe o nome dela. A punheta basta. É a gostosa do 31-A. Só.