Estava eu numa salinha apertada e mal iluminada. À minha frente havia uma fila e um balcão onde efetuavam-se inscrições. Encontro um conhecido e começo a traçar um diálogo. Acabo perdendo o prazo da inscrição. As pessoas que estavam na fila já não mais estavam lá. O cenário muda rapidamente e a sala ganha mais um espaço em que o chão é composto por ladrilhos cintilantes de discoteca. Nós (os presentes), fomos obrigados a assistir a um enfadonho show de mágica em que o protagonista conduzia uma bola colorida com sua varinha de condão fazendo com que ela aparecesse de desaparecesse repentinamente em diferentes ladrilhos. Diriji-me até o balcão e aleguei ter um comprmisso inadiável na tentativa de livrar-me de todo aquele marasmo. A balconista com óculos losangulares refutou meu pedido acreditando ser uma clara desculpa de fuga e ordenou, sem tirar os olhos da lixa que polia suas unhas vermelhas, que eu sentasse e aguardasse até o final do espetáculo.
INTERLÚDIO*
O próspero fazendeiro aperta sorridente a mão do vendedor de fertilizantes. Fertilizante I-M-P-O-R-T-A-D-O, enchia a boca para falar essa palavra que soava tão bem. Um luxo!
A cena termina com um close no pacote de fertilizante. A próxima cena se inicia com o pacote na mesma posição sendo aberto com uma tesoura. No próximo quadro, figura uma imensidão verde ao horizonte em sintonia com o belo azul do céu de brigadeiro. Eis que surge o próspero fazendeiro no canto esquerdo da tela cantarolando alegremente, fertilizando sua terra com o produto adquirido à pouco. Ele segue seu trajeto rotineiro até sair de cena no canto direito da tela. Aos poucos, no meio da paisagem bucólica começa a se abrir uma cortina, revelando algo ainda irreconhecível. A câmera se aproxima lentamente desvendando milhões de rostos sujos e esqueléticos, olhos cheios de lágrimas. Lágrimas exaladas de corpos famintos. Corpos cuja felicidade maior estaria assegurada por refeições dignas diariamente, algo que para poucos é tão corriqueiro permitindo o crime o do desperdício.
O som do assobio do fazendeiro próspero começa baixinho ao fundo e vai aumentando. A câmera enquadra sua mão esquerda que com um leve movimento emite brilhos intensos devido ao anel de ouro no dedo médio. Ele está a acariciar amavelmente um pé de soja, uma de suas queridas filhas. A vida não é mesmo um campo florido? indagava a sí mesmo. Para que se preocupar se suas queridas filhas estavam bem? A brisa úmida beijava gentilmente os ramos dos pésinhos de soja, suas queridas filhas. A vida não é mesmo um campo florido?
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