terça-feira, novembro 02, 2004

Amor e mercado não foram feitos um para o outro

Somente no dia em que o amor for totalmente livre, livre de qualquer condicionamento ou limitação, saberemos realmente o que é amar. O amor matrimonial está muito aquém da liberdade, dado o seu caráter de posse, de "proprietarização". A humanidade aprendeu a cercear o amo livre taxando-o como fonte de pecados, contribuindo assim, para limitá-lo ao amor fictício reconhecido pela assinatura do tabelião. Infelizmente, dogmas antiquados ainda teimam em habitar o imaginário reacionário de pessoas que condenam iniciativas em prol da libertação amorosa.
Como se não bastasse esse triste quadro, o hábito capitalista de manufaturar os sentimentos e botá-los à venda com o auxílio dos "slogans" apelativos do mundo publicitário, nos levou a encarar o amor como um produto palpável, limitado apenas às dimensões de uma embalagem colorida. Nos deparamos repetidas vezes com a palvra "amor" em anúncios de propaganda sem mais nos darmos conta de que seu significado foi escrachado para servir ao mercado. Isso, em certa medida, reflete-se de forma negativa nas relações interpessoais ao passo que cria-se a noção de que o amor é uma troca recíproca de bens materiais e, caso não exista esse elo pré-estabelecido em uma relação amorosa, ela não pode ser considerada uma verdadeira relação amorosa. O amor é o ato de doação totalmente gratuito, e não mercadoria de valor agregado.
Outro aspecto que contribui para perpetuar a alienação no que diz respeito ao amor como um todo é a ação nociva da cultura de massa, que tem as telenovelas como seu principal representante. As telenovelas abordam o amor de forma irreal por meio de clichês românticos que bebem nas fontes do século XIX. Seja através do casal que enfrenta barreiras familiares para ficar junto ou por meio do mocinho pobre que entrega-se de coração à amada abastada, o discurso regurgitado das telenovelas ajuda, apenas, a manter massas populacionais estagnadas em um passado longínquo. Mas também não há porque martirizar apenas as telenovelas. Vale lembrar que qualquer manifestação oral ou visual que atue no sentido de banalizar os sentimentos - como é o caso das chamadas músicas "pop" - já é suficiente para manter viva essa mentalidade retrógrada.
Mas, afinal, o que realmente é o amor? Há séculos o homem tenta responder essa pergunta, mas sem sucesso quanto às respostas. Isso, porque as relações humanas não são estáticas e concretas, elas enfrentam processos de mutação ao decorrer da história e reinventam-se de acordo com o tipo de sociedade em exercício. Seria difícil estabelecer o que é o amor nos dias atuais, sobretudo se considerarmos que nunca soubemos exercê-lo de forma correta, isto é, livremente. O perceptível, apenas, é que são criados valores artificiais sob o consentimento comercial, que são posteriormente incorporados mediante ao avassalador poder midiático. Se o verdadeiro amor é sinônimo de liberdade, teremos de fazer um contorno de cento e oitenta graus em nossos conceitos para começar a trilhar o caminho do amor livre.

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