segunda-feira, junho 13, 2005

O preconceito que vem de baixo

Reivindicando minha parcela como vítima



Acho que todo mundo já está meio farto de ler sobre preconceitos. Com essa nova cartilha do Lula então (aquela mesma que ensinou o Brasil a maneira correta de se referir aos estereótipos), nem se fale. Mas sinto muito, eu me vi forçado a escrever sobre o assunto. Entretanto, o intuito não é defender os afro-descendentes, os nipônicos, os “entendidos”, os profissionais-de-barbearia ou ainda os naturais-da-região-nordeste. Puxando a sardinha para o meu lado, escrevo o referido para defender os do meu tipo, os caras cuja estatura física atingiu patamares superiores aos limites estipulados para a normalidade.
Nós, os muito altos, sofremos tanto preconceito como qualquer outra, assim denominada, “minoria” da sociedade. Lembro-me bem de uma vez, quando estava no primeiro ano do ensino médio, que fui numa excursão do colégio ao Hoppi Hari, um recém inaugurado parque de diversões na Rodovia dos Bandeirantes. Depois de arcar com os custos do passeio, agüentar 40 minutos de gritaria dentro de um ônibus sem ar-condicionado e esperar na fila pra pegar meu ingresso, tive uma desagradável surpresa ao descobrir que o limite de altura para os brinquedos era, na esmagadora maioria dos casos, um metro e noventa e dois centímetros. Nem no bate-bate, um dos maiores clássicos da minha infância querida, eu pude ir. No final das contas, passei o dia sentando numa sala vendo Sessão da Tarde, enquanto TODOS os meus amigos se divertiam. Isto é um absurdo!
E não foi só nessa vez que fui colocado numa situação constrangedora por causa da minha altura. Por exemplo: vocês não imaginam meu desconforto ao escolher ovos de páscoa. É impressionante como nenhum lojista consegue pensar numa maneira diferente de dispor o produto, que não seja na forma de um minúsculo arco de um metro e noventa de altura. Um recado: as prateleiras não fazem tanto sucesso a toa. Além disso, os supermercados têm aqueles cartazes que ficam presos no teto por fiozinhos de nylon. Não me é raro enfiar a cabeça em alguma promoção de cebolas qualquer, disposta de forma preconceituosa (quase proposital) nos corredores de varejos mil. Como se o embaraço e a irritação não bastassem, sempre tem alguém pra dar uma risadinha de canto de boca e fazer algum comentário maldoso, propositalmente perceptível, tornando o quadro ainda mais constrangedor.
Isso tudo sem citar a falta de carros apropriados, roupas longas o suficiente, tênis capazes de abrigar nossos pés, bonés que não fiquem ridiculamente pequenos em nossas cabeças ou lugares confortáveis para realizar viagens longas.
Apesar desses inconvenientes, o maior mal ainda é o pré-conceito propriamente dito, as idéias e conclusões que se tiram, sem conhecimento suficiente, sobre nosso grupo. Hoje eu entendo perfeitamente como um rapaz negro se sente ao ser olhado de forma desconfiada. Pois bem, pensam que com a gente é diferente? Não. A idéia geral é que todo cara grande é meio lerdo, um tanto parvo, tem uma leve apreciação pela violência e, por definição, joga basquete. Sinceramente, não me lembro de ter conhecido alguém que, em algum momento, não tenha me perguntado se eu jogo basquete. “Olha, ele tem mais de dois metros de altura, vou falar de basquete por que provavelmente ele joga!”. Pois bem, eu não jogo. Pra falar a verdade, chego a desgostar. Por incrível que pareça, nós somos tão capazes de conversar sobre assuntos como cinema, música, religião, política ou futebol como qualquer outro ser humano desta nação brasileira. Desconsidero ainda a observação do óbvio, o clássico “Porra! Tu é grande pra caralho, hein!”. Não, não sou. Vocês que são pequenos... Gente é uma merda mesmo.

Chega de apelidos idiotas como montanha e gigante, ou ainda os atribuídos pelo antônimo, tipo pequeno, miúdo, little John. Além disso, de hoje em diante, não mais quero ser referido por termos característicos do colóquio, como grande, pirulão ou robusto. Decreto todos pejorativos. E a próxima vez que alguém for dizer “vira a direita onde tá aquele gigante ali”, é melhor que diga, para o bem de todos, favorecido-geneticamente-em-caráter-dominante-para-estatura. Nós não somos meio violentos mesmo? Recomendo que comecem a tomar cuidado.

E branco é o caralho, eu sou ítalo-descendente, porra.

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